A Outra Banda da Lua lança “Entre a Terra e o Sol” e reinventa sua sonoridade após saída de Marina Sena
A Outra Banda da Lua mergulha em novas sonoridades no álbum “Entre a Terra e o Sol”, lançado em 3 de outubro pelo selo Alá Comunicação e Cultura. O trabalho marca a primeira fase do grupo após a saída de Marina Sena, cofundadora da banda que hoje segue carreira solo de destaque no mainstream brasileiro.
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Produzido por Matheus Bragança (voz e baixo) e André Oliva (voz e guitarras), o disco se revela como uma travessia em busca de identidade. É um reflexo do amadurecimento artístico do sexteto, que segue explorando o imaginário sertanejo e geraizeiro do Norte de Minas, mas agora em diálogo intenso com referências psicodélicas, eletrônicas e pop. Para Bragança, o álbum é quase uma resposta ao momento de reinvenção vivido após a saída da antiga parceira: “Esse disco mistura nossa busca pessoal e coletiva por identidade”.
A Outra Banda da Lua, por Sarah Leal |
Gravado entre Montes Claros e Belo Horizonte, o álbum foi concebido como um mergulho profundo na experimentação sonora. Ao longo de 12 faixas, a banda costura duas atmosferas distintas: a primeira, solar, herda o balanço de Tim Maia, Gilberto Gil e Marku Ribas, trazendo luz e calor ao início da jornada; a segunda, noturna, mergulha em densidades que evocam a introspecção de Radiohead, o experimentalismo do Metá Metá e a delicadeza de artistas como Luedji Luna e Céu.
Essa dualidade entre luminosidade e sombra faz do disco uma experiência múltipla. Em alguns momentos, a música soa leve e dançante, quase convidando a celebrar o sertão. Em outros, a atmosfera se torna contemplativa e densa, refletindo sobre questões existenciais, sociais e espirituais. O resultado é um trabalho de nuances, que não abre mão de sua identidade mineira, mas que também se abre para o diálogo com o mundo.
O percurso começa com “Sol na Mulêra”, um retrato sonoro da força abrasadora do sertão. Escrita em 2015, mas só lapidada agora coletivamente, a faixa traduz o calor intenso de Montes Claros em arranjos que oscilam entre vigor e delírio. Logo em seguida, “Três Fitinhas” surge como uma delicada crônica sobre amizade e saudade, marcada por versos simples, circulares, que se apoiam na tradição da música brasileira e no balanço do funk soul.
Em “Moreno”, a participação da cantora mineira Gabriela Viegas acrescenta ainda mais frescor a uma faixa que transforma o Mercado Central de Montes Claros em palco para um romance cheio de sensações. O reggae e o dub aparecem aqui como elementos de sofisticação melódica, criando um clima dançante e introspectivo ao mesmo tempo. Já “Bougainville Azul” aposta em arranjos mais enxutos e flutuantes, refletindo sobre desejo e liberdade, mas também sobre a coragem de sorrir mesmo diante da dor.
Na segunda metade, o disco mergulha em atmosferas mais noturnas. “Kolofé”, escrita por Edssada, carrega a força espiritual da oralidade da diáspora africana, funcionando como um pedido de bênção e uma celebração das raízes que sustentam o fazer cultural. “Homem no Tempo”, por sua vez, assume uma cadência quase de mantra, refletindo sobre a interdependência entre natureza e humanidade, como se fosse uma oração coletiva.
“Ardo Árido” amplia ainda mais esse diálogo com o território e com o povo geraizeiro, fruto de uma composição coletiva que se transforma em retrato da resistência sertaneja. Entre letras e poesia, a canção mostra como a dureza da geografia pode se converter em música e beleza. Por fim, o disco se encerra com “Tudo Se Transforma”, faixa que sintetiza o espírito do álbum. Nascida a partir de um instrumento indiano e versos em português e inglês, ela oferece um convite à renovação e à esperança, abrindo caminhos para o futuro sem se desprender das raízes.
A sonoridade do álbum se expande também no campo visual. Para acompanhar o lançamento, a banda preparou oito visualizers, dirigidos por Tainá de Castro e Caril, filmados em Pirapora e Montes Claros. Mais do que vídeos, essas imagens funcionam como extensões das canções, dando corpo ao imaginário sertanejo e destacando personagens, afetos e pertencimento.
Assim, o disco se estabelece como um marco da nova fase da banda: uma obra que mantém as raízes fundas no sertão, mas abre seus galhos para o mundo. Um trabalho que olha para o passado com respeito, para o presente com coragem e para o futuro com esperança. Entre a terra e o sol, A Outra Banda da Lua reafirma que é possível ser local e universal ao mesmo tempo.